quarta-feira, junho 24

Há 12 anos saí de casa e nunca mais voltei...

Ando há anos para escrever sobre isto.
Perdi a conta à quantidade de vezes que escrevi e apaguei, que escrevi e guardei. Este é dos textos mais difíceis que alguma vez partilhei. Remete a partes da minha história bem sensíveis e sobre os quais não me quero expressar. Mas há algo que gostaria muito de vos contar:

Há 12 anos saí de casa e nunca mais voltei…

Esta é aquela frase que me custa escrever sobre a minha história. É uma frase que define um dos grandes marcos da minha vida. Esta forma de a transmitir pode ser interpretada de diversas formas e isso faz com que não goste muito dela. Mas, de forma bem resumida e racional, foi isso que aconteceu. Não importam os motivos nem o que tudo isso envolveu. Daria uma longa história...

Hoje quero escrever sobre algo muito importante para mim: a escrita. E porquê começar assim, neste ponto sensível da minha história?
Vamos começar pelo início…
Estes dias estive a reunir todos os textos que tenho guardados, que nunca publiquei, mas que sempre julguei que talvez, um dia, fosse publicar. Ainda não aconteceu. Reli alguns, todos os que consegui. E foi tão bom.
Este recordar de textos, de recordar memórias e sentimentos faz-me retornar a tudo aquilo que sempre me acompanhou: as palavras.
Escrever surgiu na minha vida de uma forma muito natural. O entusiasmo por ser capaz de expressar sentimentos e experiências foram o motor de arranque para aquilo que se tornou na minha melhor "terapia". Mesmo sem noção da sua importância e do peso que um dia teria para mim, a escrita tornou-se um vício. Todos precisamos de um escape, de algo que nos obrigue a parar, a repensar. Escrever deu-me, desde sempre, essa possibilidade. A possibilidade de recordar, de sequenciar acontecimentos, de compreender experiências e de as amadurecer dentro de mim. Longe de julgamentos, de interpretações enviesadas, longe de olhares de reprovação, aquilo era meu. Ninguém nos pode julgar por aquilo que sentimos. Os sentimentos são algo muito pessoal, muito nosso. Só nós os compreendemos de verdade. Escrever deu-me a possibilidade de colocar no papel sentimentos que nunca partilhei com mais ninguém. O meu diário tornou-se no meu melhor amigo, o meu diário era o meu maior confidente.

Quando saí de casa previ tantas coisas que poderiam acontecer. Sabia que podia não regressar. Então, pensei em tudo aquilo que queria guardar. Pouco importava o que ficasse. Havia 3 coisas que queria guardar para sempre. Sabia, por ordem, as coisas das quais não queria abdicar: as páginas que registaram a minha história e os meus segredos, as páginas que eternizaram todos os sentimentos que fui capaz de expressar era a primeira. Sou péssima a comunicar verbalmente. Não digam o contrário, sou horrível. Sinto um aperto no peito e uma taquicardia tão grande que o nervosismo paralisa todas as palavras. Mas, se me derem uma página em branco, aí eu sou feliz. Escrevo ao ritmo do pensamento, sem pensar duas vezes, sem voltar atrás, sem correção. As palavras fluem pelo papel da mesma forma que o pensamento surge. É tão mais fácil expressar-me assim.

E falo sobre isto porquê?
Porque perdemos tempo demais a acumular, a desejar isto e aquilo, o que imaginamos, o que vemos e o que nos impingem como necessário.
Mas, na realidade, de todas as coisas que podemos levar da vida, a única que faz falta continuar a acompanhar-nos é a nossa história. Por muito que as fotos retratem momentos, as palavras continuarão a eternizar sentimentos. E são os sentimentos que nos preenchem. São eles que nos fazem sentir, que nos dão vida. Um dia, todos podemos ficar sós, sem nada. Mas a nossa história estará lá, na nossa sombra, para nos acompanhar. Dela não podemos abdicar. Nunca. Por muito que mude, por muitas voltas que a vida possa dar, por muito que gostássemos de apagar uma ou outra coisa, ou de acrescentar um ou outro pormenor, é ela que nos faz ser quem somos. E deixar partes da nossa história escritas é eternizar tudo aquilo que um dia nos possamos esquecer.

Reler tudo o que sentimos anos depois de o descrevemos é algo absolutamente fenomenal. Quando releio páginas da minha história sou capaz de me situar naquele momento e imaginar-me a viver tudo novamente. E este recordar da nossa história é tão bom para nos ajudar a compreender melhor quem somos de verdade.
Posso não ter muito mais do que alguns diários guardados, posso não ter muito mais que me faça recordar sobre o meu passado, de quem fui, de como cresci; mas enquanto tiver possibilidade de montar as peças do puzzle e recordar toda a história, então estarei completa. Então nunca esquecerei porque estou aqui.

Quando saí de casa não levei muito mais do que isso. E pouco mais faria falta. Porque na realidade não precisamos de muito mais para além de nós mesmos. Para aceitar o presente e encarar o futuro só precisamos da experiencia que a vida nos dá, das histórias que carregamos e que podemos contar, dos sentimentos que nos marcaram e que nos deixaram mais fortes ou mais sensíveis.

Posso abdicar de tudo, mas sei que as páginas da minha história continuarão a acompanhar-me. Aqui e online, ou em privado e offline, continuarei a registar tudo o que for capaz. Porque um dia, é apenas isto que quero recordar. Os sentimentos que vivi em cada uma das fases que percorri. São eles que tornam cada parte da nossa história ainda mais inesquecível.
Só desejo que a vida me dê tempo e saúde para continuar a registar.

Todos temos uma história. A minha tem muito valor, é a minha. E tu, dás valor á tua?



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