Perdi a conta à quantidade de vezes que escrevi e apaguei, que escrevi e guardei. Este é dos textos mais difíceis que alguma vez partilhei. Remete a partes da minha história bem sensíveis e sobre os quais não me quero expressar. Mas há algo que gostaria muito de vos contar:
Há 12 anos saí de casa e nunca mais
voltei…
Esta é aquela frase que me custa
escrever sobre a minha história. É uma frase que define um dos grandes marcos
da minha vida. Esta forma de a transmitir pode ser interpretada de diversas
formas e isso faz com que não goste muito dela. Mas, de forma bem resumida e
racional, foi isso que aconteceu. Não importam os motivos nem o que tudo isso
envolveu. Daria uma longa história...
Hoje quero escrever sobre algo muito
importante para mim: a escrita. E porquê começar assim, neste ponto sensível da
minha história?
Vamos começar pelo início…
Estes dias estive a reunir todos os
textos que tenho guardados, que nunca publiquei, mas que sempre julguei que
talvez, um dia, fosse publicar. Ainda não aconteceu. Reli alguns, todos os que
consegui. E foi tão bom.
Este recordar de textos, de recordar memórias e sentimentos faz-me retornar
a tudo aquilo que sempre me acompanhou: as palavras.
Escrever surgiu na minha vida de uma
forma muito natural. O entusiasmo por ser capaz de expressar sentimentos e experiências
foram o motor de arranque para aquilo que se tornou na minha melhor "terapia".
Mesmo sem noção da sua importância e do peso que um dia teria para mim, a
escrita tornou-se um vício. Todos precisamos de um escape, de algo que nos obrigue
a parar, a repensar. Escrever deu-me, desde sempre, essa possibilidade. A
possibilidade de recordar, de sequenciar acontecimentos, de compreender experiências
e de as amadurecer dentro de mim. Longe de julgamentos, de interpretações enviesadas,
longe de olhares de reprovação, aquilo era meu. Ninguém nos pode julgar por
aquilo que sentimos. Os sentimentos são algo muito pessoal, muito nosso. Só nós
os compreendemos de verdade. Escrever deu-me a possibilidade de colocar no
papel sentimentos que nunca partilhei com mais ninguém. O meu diário tornou-se
no meu melhor amigo, o meu diário era o meu maior confidente.
Quando saí de casa previ tantas coisas
que poderiam acontecer. Sabia que podia não regressar. Então, pensei em tudo
aquilo que queria guardar. Pouco importava o que ficasse. Havia 3 coisas que
queria guardar para sempre. Sabia, por ordem, as coisas das quais não queria abdicar: as
páginas que registaram a minha história e os meus segredos, as páginas que
eternizaram todos os sentimentos que fui capaz de expressar era a primeira. Sou
péssima a comunicar verbalmente. Não digam o contrário, sou horrível. Sinto um
aperto no peito e uma taquicardia tão grande que o nervosismo paralisa todas as
palavras. Mas, se me derem uma página em branco, aí eu sou feliz. Escrevo ao
ritmo do pensamento, sem pensar duas vezes, sem voltar atrás, sem correção. As
palavras fluem pelo papel da mesma forma que o pensamento surge. É tão mais
fácil expressar-me assim.
E falo sobre isto porquê?
Porque perdemos tempo demais a acumular,
a desejar isto e aquilo, o que imaginamos, o que vemos e o que nos impingem
como necessário.
Mas, na realidade, de todas as coisas
que podemos levar da vida, a única que faz falta continuar a acompanhar-nos é a
nossa história. Por muito que as fotos retratem momentos, as palavras
continuarão a eternizar sentimentos. E são os sentimentos que nos preenchem.
São eles que nos fazem sentir, que nos dão vida. Um dia, todos podemos ficar
sós, sem nada. Mas a nossa história estará lá, na nossa sombra, para nos
acompanhar. Dela não podemos abdicar. Nunca. Por muito que mude, por muitas
voltas que a vida possa dar, por muito que gostássemos de apagar uma ou outra
coisa, ou de acrescentar um ou outro pormenor, é ela que nos faz ser quem
somos. E deixar partes da nossa história escritas é eternizar tudo aquilo que
um dia nos possamos esquecer.
Reler tudo o que sentimos anos depois de
o descrevemos é algo absolutamente fenomenal. Quando releio páginas da minha
história sou capaz de me situar naquele momento e imaginar-me a viver tudo
novamente. E este recordar da nossa história é tão bom para nos ajudar a
compreender melhor quem somos de verdade.
Posso não ter muito mais do que alguns
diários guardados, posso não ter muito mais que me faça recordar sobre o meu
passado, de quem fui, de como cresci; mas enquanto tiver possibilidade de
montar as peças do puzzle e recordar toda a história, então estarei completa.
Então nunca esquecerei porque estou aqui.
Quando saí de casa não levei muito mais
do que isso. E pouco mais faria falta. Porque na realidade não precisamos de
muito mais para além de nós mesmos. Para aceitar o presente e encarar o futuro
só precisamos da experiencia que a vida nos dá, das histórias que carregamos e que
podemos contar, dos sentimentos que nos marcaram e que nos deixaram mais fortes
ou mais sensíveis.
Posso abdicar de tudo, mas sei que as
páginas da minha história continuarão a acompanhar-me. Aqui e online, ou em
privado e offline, continuarei a registar tudo o que for capaz. Porque um dia,
é apenas isto que quero recordar. Os sentimentos que vivi em cada uma das
fases que percorri. São eles que tornam cada parte da nossa história ainda mais inesquecível.
Só desejo que a vida me dê tempo e saúde
para continuar a registar.
Todos temos uma história. A minha tem muito valor, é a minha. E tu, dás valor
á tua?
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