segunda-feira, abril 25

Are you free? Um texto sobre o 25 de abril ou algo do género.

 Tenho a ligeira sensação de que o 25 de abril já não significa o mesmo. Tenho a ligeira sensação de que já não se vibra pela mesma vitória, a da liberdade. Não acredito que seja por estar longe, mas pela forma como se escreve sobre este dia.


Nunca fui a melhor a história. Mas com os acontecimentos recentes, de guerra e de massacre, de atentado à liberdade humana, tenho repensado no quão horripilante deve ser viver em ditadura. O medo paralisa. O medo impede de viver. O medo ofusca a visão e debilita. O medo tira vidas. Viver em ditadura deve ser algo assustador. Há quem diga que há quem se acostume. Talvez. Mas aí não estará a viver.

Num mundo cada vez mais aberto à mudança e à diferença, assusta-me o facto de também se revelar aberto a uma nova forma de ditadura: a ditadura do poder, do comunismo disfarçado de liberdade, ao salazarismo mascarado de "igualdade". Assusta-me que, em tempos como o nosso, em que qualquer um sobe ao poder com mais facilidade, que pessoas ocas e disfarçadas de bom messias se apuderem e derrubem o que se construiu. Se algum dia isso acontecer, aqui ou um outro qualquer lugar, o povo também tem culpa. Nós, que seremos o povo que o permitiu, devemos dar-nos ao trabalho de refletir e repensar sobre o que está a ser dito e prometido, e não ir atrás do que é mais bonito ou popular.

A liberdade é interpretada de diferentes formas. E normalmente cada um atribui o significado que quer. Mas que não voltemos a ser privados de uma liberdade que é básica, a de ter o direito de viver no país que se nasceu (ou se escolheu viver).

Sejamos livres. E que repensemos as nossas escolhas de cada vez que elas puderem retirar-nos ou acrescentar-nos liberdade, a liberdade que merecemos viver.



sábado, abril 16

Precisamos de atribuir às famílias a mesma responsabilidade que atribuímos às outras relações

 

É comum na nossa sociedade que, em alturas festivas como a Páscoa, a família se reúna. É também normal que os laços familiares sejam encarados como os únicos que nunca terminarão. E, desta forma, por muitos conflitos que existam, carregamos a “responsabilidade ou a culpa” de nos mantermos em conexão, em proximidade e em ligação. Não importa se são pais, tios, avós, ou ainda parentes de 1º, 2º ou 3º grau: é família e por isso devemos “respeitar” e manter a relação, nunca quebrá-la.

 

Sou de opinião que a família, pai e mãe, marido ou mulher, irmãos, tios, avós, são essenciais para a vida e o bem-estar das crianças, futuros adultos. Sou também da opinião que todas as crianças têm o direito a serem criadas numa “aldeia”, e que várias figuras de referência são benéficas para o seu desenvolvimento global.

Mas, também sou de opinião que, quando estas mesmas pessoas de referência se tornam tóxicas, seja qual for o papel que assumem, devem ser consideradas da mesma forma que consideramos todas as pessoas que incluímos em todos os outros tipos de relações.

 

O papel que exercemos sobre um filho, por exemplo, sobretudo nos mais novos, é poderoso. Devemos sim ser o exemplo “quase perfeito” de como se deve levar a vida, de como se devem enfrentar os desafios e, muito importante, de como nos devemos relacionar entre todos.

Quando consideramos que fazer parte de uma família é obrigatório estamos a aceitar que o que nos fazem não é tão importante como o papel que as pessoas exercem umas sobre as outras (pai, mãe, tio, tia, primo, sobrinho, entre outros…).

É importante começar a desmistificar tudo isto e a atribuir às famílias a mesma responsabilidade que atribuímos a todas as outras relações.



Se um amigo nos magoa consecutivamente, somos da opinião que devemos afastar-nos, porque essa pessoa e essa relação não nos faz bem. Mas, e se for um pai ou uma mãe? Por que razão estamos apenas formatados para aceitar isso como normal e parte da relação?

Se um colega de trabalho nos maltrata, agimos em conformidade com as leis e procuramos defender a nossa integridade enquanto pessoa. Mas, e se for um familiar? Por que razão tentamos resolver “a situação a bem”?

Se um chefe nos desrespeita, tomamos a decisão de mudar de trabalho. Mas, e se for um cônjuge, por que razão aceitamos continuar no mesmo lugar?

Se um vizinho invade a nossa propriedade, chamamos as autoridades e procuramos ficar em segurança. Mas, se um qualquer familiar invade a nossa privacidade, por razão permitimos que esse comportamento se continue a perpetuar?

 

É obrigatório parar para pensar sobre isto. A família é importante. Desde que seja um lugar seguro e saudável para ficar. Ter uma família é importante. Desde que seja nela que encontramos o nosso verdadeiro lugar, um lugar de suporte, de compreensão, de amor, de respeito, de carinho… Um lugar que seja capaz de nos aceitar como somos e não de nos julgar, desrespeitar ou maltratar.

Quando, por algum motivo, a família deixa de cumprir os requisitos que a façam encaixar num padrão de relação saudável, será nesse momento que precisamos de a repensar.

Continuar a considerar a família como algo obrigatório e algo que ficará para sempre na nossa vida é continuar a aceitar que tantas coisas continuem a acontecer. É continuar a aceitar que os elementos podem fazer o que quiserem, que os mais velhos não precisam de respeitar os mais novos, porque estes lhes devem respeito e adoração. É continuar a aceitar que o marido é o chefe da família e a mulher lhe deve submissão. É continuar a aceitar que os irmãos se possam agredir e maltratar, porque a disputa é saudável e faz parte dessa relação. É continuar a aceitar que não importa o que nos façam, nos iremos lá ficar. É continuar a aceitar que uns elementos têm poder sobre os outros e os mais “sensíveis, frágeis ou mais novos” têm que comer e calar.

 

Precisamos de atribuir à família a mesma responsabilidade que atribuímos a todas as outras relações. Só assim os seus elementos terão os outros em consideração.

 

A família é para sempre? Talvez. Mas a sua relação não.





terça-feira, abril 12

Meu filho,... Em breve, irás perceber.

 

Meu filho,

Em breve, irás perceber.

Em breve, irás perceber que a maioria das pessoas quer que sejas aquilo que procuram. A maioria das pessoas não quer que sejas aquilo que és.

As pessoas vivem projetando nos outros o que lhes falta, colocando e depositando nos outros o motivo das suas falhas e tentando buscar nelas a versão melhorada de si mesmo. Elas não querem que sejas o que és, porque isso não colmata as suas lacunas. Isso só as coloca à prova e acrescenta um desafio, o de se tentarem completar sozinhas para serem capazes de te aceitar.

Meu filho, a realidade dos crescidos é (ainda mais) dura. É feita de compensações. As pessoas projetam os seus medos e frustrações nos outros com receio de nunca se sentirem realizadas. Isso acontece porque a maioria das pessoas nem sabe quem é. Muitas dessas pessoas esqueceram-se de alimentar e viver o que são, algures no tempo.

Mas, em breve, irás perceber.

Irás perceber que as pessoas não querem saber dos teus sonhos, a menos que estejas SEMPRE lá para as ajudar a alcançar os delas.

As pessoas não querem saber se estás bem, a não ser que estejas sempre lá para elas e a tua presença será, para essas mesmas pessoas, o único sinal de que estás feliz. Mesmo que não estejas.

Em breve, irás perceber que as pessoas não querem que sejas bem-sucedido. A menos que isso as possa ajudar a chegar mais longe, ou a algum lugar que elas acreditem querer estar, mesmo que indefinido.

As pessoas não querem saber sobre as tuas dores. Custa demais apoiar o outro. Elas querem e precisam de ti, do teu apoio. Mas de tão focadas no seu ego, elas esquecerão de apoiar a tua dor.

Meu filho…

Em breve, irás perceber. Irás perceber que as pessoas são mais maldosas do que parecem, que viver num mundo assim dói. Não te deixes nunca enganar. Se deixares, dá meia volta. Não te deixes lá ficar.

Meu filho… Em breve irás perceber tudo isto e muito mais.

Mas quero que saibas, eu não quero que sejas o que idealizei, o que não fiz de mim, o que desejei viver e não vivi. Não quero que sejas a minha dupla nesta vida, quero que sejas uma das minhas melhores obras de arte. Eu criei-te, agora é hora de deixares que seja o mundo a moldar-te.

Uma coisa podes acreditar eu não sou como as outras pessoas. Eu não quero que sejas o que falta em mim. Eu quero que sejas tu e que o teu voo seja do tamanho do teu sonho. Não do meu.