sábado, abril 16

Precisamos de atribuir às famílias a mesma responsabilidade que atribuímos às outras relações

 

É comum na nossa sociedade que, em alturas festivas como a Páscoa, a família se reúna. É também normal que os laços familiares sejam encarados como os únicos que nunca terminarão. E, desta forma, por muitos conflitos que existam, carregamos a “responsabilidade ou a culpa” de nos mantermos em conexão, em proximidade e em ligação. Não importa se são pais, tios, avós, ou ainda parentes de 1º, 2º ou 3º grau: é família e por isso devemos “respeitar” e manter a relação, nunca quebrá-la.

 

Sou de opinião que a família, pai e mãe, marido ou mulher, irmãos, tios, avós, são essenciais para a vida e o bem-estar das crianças, futuros adultos. Sou também da opinião que todas as crianças têm o direito a serem criadas numa “aldeia”, e que várias figuras de referência são benéficas para o seu desenvolvimento global.

Mas, também sou de opinião que, quando estas mesmas pessoas de referência se tornam tóxicas, seja qual for o papel que assumem, devem ser consideradas da mesma forma que consideramos todas as pessoas que incluímos em todos os outros tipos de relações.

 

O papel que exercemos sobre um filho, por exemplo, sobretudo nos mais novos, é poderoso. Devemos sim ser o exemplo “quase perfeito” de como se deve levar a vida, de como se devem enfrentar os desafios e, muito importante, de como nos devemos relacionar entre todos.

Quando consideramos que fazer parte de uma família é obrigatório estamos a aceitar que o que nos fazem não é tão importante como o papel que as pessoas exercem umas sobre as outras (pai, mãe, tio, tia, primo, sobrinho, entre outros…).

É importante começar a desmistificar tudo isto e a atribuir às famílias a mesma responsabilidade que atribuímos a todas as outras relações.



Se um amigo nos magoa consecutivamente, somos da opinião que devemos afastar-nos, porque essa pessoa e essa relação não nos faz bem. Mas, e se for um pai ou uma mãe? Por que razão estamos apenas formatados para aceitar isso como normal e parte da relação?

Se um colega de trabalho nos maltrata, agimos em conformidade com as leis e procuramos defender a nossa integridade enquanto pessoa. Mas, e se for um familiar? Por que razão tentamos resolver “a situação a bem”?

Se um chefe nos desrespeita, tomamos a decisão de mudar de trabalho. Mas, e se for um cônjuge, por que razão aceitamos continuar no mesmo lugar?

Se um vizinho invade a nossa propriedade, chamamos as autoridades e procuramos ficar em segurança. Mas, se um qualquer familiar invade a nossa privacidade, por razão permitimos que esse comportamento se continue a perpetuar?

 

É obrigatório parar para pensar sobre isto. A família é importante. Desde que seja um lugar seguro e saudável para ficar. Ter uma família é importante. Desde que seja nela que encontramos o nosso verdadeiro lugar, um lugar de suporte, de compreensão, de amor, de respeito, de carinho… Um lugar que seja capaz de nos aceitar como somos e não de nos julgar, desrespeitar ou maltratar.

Quando, por algum motivo, a família deixa de cumprir os requisitos que a façam encaixar num padrão de relação saudável, será nesse momento que precisamos de a repensar.

Continuar a considerar a família como algo obrigatório e algo que ficará para sempre na nossa vida é continuar a aceitar que tantas coisas continuem a acontecer. É continuar a aceitar que os elementos podem fazer o que quiserem, que os mais velhos não precisam de respeitar os mais novos, porque estes lhes devem respeito e adoração. É continuar a aceitar que o marido é o chefe da família e a mulher lhe deve submissão. É continuar a aceitar que os irmãos se possam agredir e maltratar, porque a disputa é saudável e faz parte dessa relação. É continuar a aceitar que não importa o que nos façam, nos iremos lá ficar. É continuar a aceitar que uns elementos têm poder sobre os outros e os mais “sensíveis, frágeis ou mais novos” têm que comer e calar.

 

Precisamos de atribuir à família a mesma responsabilidade que atribuímos a todas as outras relações. Só assim os seus elementos terão os outros em consideração.

 

A família é para sempre? Talvez. Mas a sua relação não.





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